domingo, 27 de novembro de 2016

Fidel e a História

Desde que ouvi a notícia da morte de Fidel Castro, a mensagem mais repetida pelos mais variados comentadores nacionais e estrangeiros foi a de que a História o julgaria. Não creio na infalibilidade nem na justeza dos julgamentos da História. A História julgou Júlio César? Julgou o Marquês de Pombal? Julgou Pétain, Mao, Pol Pot, Salazar? Shakespeare descreveu em pormenor o julgamento de Júlio César, as sua dúvidas, as divisões que criou na sociedade romana da época e as suas consequências. Mesmo hoje não podemos considerar o julgamento terminado. Aos dez anos, fiz um trabalho escolar, muito elogiado pela professora, sobre o Marquês de Pombal e as consequências das suas acções. Não sei bem porquê, decidi fazer o trabalho sob a forma de um diálogo entre um defensor e um detractor de Sebastião de Carvalho e Melo. Pus os dialogantes a discutir os prós e os contras, mas no final não chegava a nenhuma conclusão, ao que hoje ainda julgo por não haver possibilidade de terminar com um julgamento justo. Penso ainda hoje que, se se optar por esperar pelo julgamento da História, é melhor esperar sentado, sob perigo de nos cansarmos de esperar.

Mas no caso de Fidel, não vale a pena esperar pelo julgamento da História porque já dispomos dos elementos necessários para formar opinião. Cada um pode fazer o seu julgamento conforme as suas ideias. No entanto assistimos a opiniões tão divergentes que parece impossível esperar por um julgamento de consenso. Temos ouvido e lido opiniões eticamente neutras com "figura marcante", "líder carismático", "histórico revolucionário", "símbolo de uma era", "lenda da esquerda sul-americana", "última figura do comunismo ocidental", entre outras. Mas, por outro lado, há quem o classifique como "herói" ou "ditador". Sintomaticamente, um comentador da SIC-Notícias declarou calmamente que Fidel não tinha sido "um ditador sanguinário", lançando estas palavras com um tom grave e arrastado. Talvez não tivesse sido "um ditador sanguinário" digno deste tom de voz, mas não falta quem o considere um ditador sanguinário dito com voz normal. A partir de quantas execuções e condenações à morte pode um líder ser considerado sanguinário? Depende da quantidade de sangue derramado? Não, a História não o vai poder julgar. Temos de ser nós a julgá-lo.

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