sexta-feira, 30 de setembro de 2016

Veto, ou melhor, devolução

Como já parecia provável, Marcelo Rebelo de Sousa não promulgou o decreto que permitia a devassa dos saldos das contas dos portugueses. Não lhe quis chamar veto, mas na realidade foi um veto. Venceu o bom-senso e o sigilo bancário. De notar a proposta muito razoável do PCP de que, em vez da devassa pretendida, seria mais aceitável tornar mais fácil o acesso das autoridades, fiscais ou outras, às contas sempre que houver indícios de crime. Isto seria muito mais lógico do que tratar como se fossem suspeitos todos os portugueses que tenham contas de valor acima de um limiar qualquer. A teimosia do BE não espanta: quem tem mais de 50000 euros numa conta é rico e dos ricos é sempre de desconfiar, porque, para os bloquistas, só é possível enriquecer à custa dos pobres. Ouvi, nos programas chamados de opinião pública, opiniões incríveis sobre o assunto. Um telespectador, por exemplo, defendia a quebra do sigilo bancário com o argumento de que só 10% dos portugueses terão possibilidade económica para possuir mais de 50000 euros no banco. Como se o número diminuto de pessoas atingidas pela devassa das contas tornasse esta mais legítima. Outros são de opinião que o sigilo bancário é um factor de obscuridade que permite ilegalidades, defendendo, para evitar esse risco, o que chamam de transparência. Para absoluta transparência só falta sermos obrigados a abrir a porta das nossas casas a qualquer investigador e a mostrar a nossa correspondência e o conteúdo dos computadores. Isso sim, seria a transparência completa.

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Homem rico, homem pobre

Tenho andado há dias a matutar de que modo podia pegar nas declarações de deputadas do BE das quais se depreende a vontade de acabar com os ricos, com o nobre propósito de assim conseguir, por via da redistribuição da riqueza assim libertada, ajudar os pobres a deixarem de o ser. Mas tem-me falhado descobrir os argumentos mais adequados para desmontar a lógica da ligação entre a vontade e o propósito. Eis que descubro, no blog Delito de Opinião, um curto parágrafo que me ajuda a expressar o que não conseguia. É este:

«De resto, “acabar com os ricos" sob o pretexto de que é preciso acabar com os pobres constitui uma mistificação grosseira: nunca pobre algum enriqueceu a partir do empobrecimento de um rico, como as chamadas “revoluções proletárias” do século XX amplamente demonstraram. Eis a maior vantagem do conhecimento histórico: evitar que se repitam trágicos erros do passado.»

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Fábulas actualizadas

Tenho na minha estante um volume que muito prezo: As Fábulas de La Fontaine na edição da Minerva de 1973 (4.ª edição) "traduzidas e adaptadas por poetas portugueses e brasileiros do século XIX". Logo a primeira é a fábula da Cigarra e a Formiga em verso segundo a tradução de Bocage. A moral é clara e muitíssimo actual. Mas mais actual ainda é a versão para bloquistas de Carlos Magalhães Pinto publicada n'O Insurgente. Ainda mais actual do que a de La Fontainen e com uma nova personagem que tem dado muito que falar nos últimos dias por ter falado demais. Obrigatório ler.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Não guardes para amanhã o que podes gastar hoje

Ficámos a saber que, para o bloco, poupar é condenável; quem poupa e consequentemente acumula dinheiro deve ser taxado, porque não há que ter vergonha de lhe tirar o que acumulou. Se acumular dinheiro é mau, o melhor é gastar logo tudo. Assim não corremos o risco que nos virem buscar o dinheiro que acumulámos. Mariana Mortágua não tem vergonha de propor o saque de quem ganhou e guardou dinheiro sem sequer admitir que esse dinheiro acumulado é provavelmente fruto de trabalho honrado, pode servir para proporcionar uma velhice sem problemas económicos a quem o guarda (que a esperança de pensões decentes é cada vez menor), pode estar reservado para deixar aos filhos (mesmo correndo o risco de mais ano menos ano vir a pagar imposto sucessório), pode estar destinado a muitas outras despesas inesperadas ou prováveis. Não, se acumulou dinheiro, não devemos ter vergonha de o ir buscar. A frase venenosa de Mariana é um convite ao gasto e uma condenação da poupança. Não admira: quem considera que a austeridade é em si uma abominação, também acha que quem poupa deve ser punido. É gastar antes que a Mariana Mortágua o venha buscar.

sábado, 17 de setembro de 2016

Apelo a acabar com o capitalismo

Como prémio por se ter antecipado ao Governo e à divulgação da política fiscal a incluir no Orçamento para 2017, anunciando o novo imposto sobre o património, o PS convidou Mariana Mortágua a estar presente e intervir no encontro de hoje em Coimbra. Em boa hora, pois Mariana aproveitou para apelar ao PS que combata o "capitalismo financeiro". Não ouvi ainda qualquer reacção do PS, mas prevejo que vai obedecer à ordem da deputada do BE. Espero notícias em breve. A nossa aproximação à situação da Venezuela deve sofrer uma rápida aceleração.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Novo imposto sobre património

A austeridade de esquerda especializou-se em dar com uma mão e tirar com a outra. Mas claro que quem recebe e quem é esbulhado não é o mesmo. A esquerda odeia os ricos e tenta apontar as baterias a quem tem mais, mas, como os realmente ricos são poucos e se sabem defender, acaba por atingir os menos ricos, os desgraçados que têm algum desafogo económico e que se vêem assim obrigados a reparti-lo por funcionários públicos, empresários de restaurantes e outras classes que a esquerda decidiu favorecer. E fala de justiça de esquerda. Sempre gostava que me explicassem que justiça é esta, tirar a uns para dar a outros. Fica uma dúvida: Porque motivo foi o anúncio da medida feito pelo Bloco de Esquerda? Se a medida ainda está em discussão, se ainda não se sabe sequer a partir de que valor será o património imobiliário taxado, se ainda não se sabe quais serão as taxas e que progressividade têm, porque foi já anunciado? Tenho uma desconfiança: O Bloco de Esquerda decidiu adiantar-se para ficar bem patente que este novo imposto foi proposto por este partido, coisa de que se orgulha, por isso provocou uma fuga de informação para o Jornal de Negócios, o que precipitou o ensejo para uma explicação no Parlamento pela voz de Mariana Mortágua. A deputada do BE é uma boa oradora e defendeu a ideia com garra, garra que faltou a Brilhante Dias, que, numa brevíssima intervenção, nada adiantou de novo. Tenho ainda uma outra dúvida: Se este imposto vai incidir apenas sobre o património imobiliário, com grande pena do PCP que o queria ver estendido ao património mobiliário, para que quer o Governo conhecer os saldos das contas de todos os residentes? É de temer pelo futuro.

E o que pensará Centeno deste imposto? Será que o imposto foi imposto pelo BE ao Ministro das Finanças? Como se explica que Centeno tenha estado na véspera no Parlamento a falar de impostos, dos directos e dos indirectos, e nada dissesse sobre um eventual novo imposto? Ou foi porque não concorda lá muito com ele ou, mais provavelmente, porque não era ainda ocasião para o anunciar.

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Luta de classes por via fiscal

Costumo ouvir com atenção os comentários de Miguel Sousa Tavares na TV. Muitas vezes concordo com os seus pontos de vista, e muitas vezes discordo, nalguns casos mesmo discordo frontalmente. Mas a classificação que fez há poucos dias da progressividade dos impostos, nomeadamente do IRS e do eventual projecto de a estender ao IMI, como uma "luta de classes por via fiscal" pareceu-me quase genial. De facto, se num estado social é compreensível uma redistribuição dos rendimentos em favor dos que menos auferem, o saque da classe média, considerada rica pele esquerda, atinge níveis intoleráveis. E a prática demonstra que quando a redistribuição é exagerada deixa de haver incentivos para produzir mais, já que parte das mais valias que o esforço consegue obter é retirado, resultando uma menor atractividade para esse esforço.

Ainda sobre os comentários de Miguel Sousa Tavares, reproduzo o que o Corta-Fitas cita da sua intervenção de 2016-09-12, também certeira:
- que, com excepção do défice, todos os indicadores (emprego, exportações, dívida, crescimento, investimento, juros) traçam um quadro negro para Portugal;
- que o governo está em negação;
- que o governo vai agravar o ataque contra os 8% de portugueses responsáveis pelo pagamento da maior fatia de impostos;
- que o crescimento só pode acontecer com investimento estrangeiro, visto que nem estado nem Banca têm dinheiro para investir;
- que o investimento, hoje, se resume ao imobiliário e que até aí o governo promete aumentos do IMI, o que, além de mudar as regras a meio do jogo, é suicidário;
- que mais grave do que a afirmação desajeitada do ministro das Finanças numa entrevista internacional, dizendo que tudo faria para evitar outro resgate, é o facto de a pergunta ter sido feita;
- que tudo aponta para novo resgate, mas que nem quer falar disso, porque será demasiado mau;
- que será uma ironia ser este governo de esquerda o responsável por esse novo resgate;
- que esta governação segue a agenda do PCP e do Bloco, não do PS.
Miguel Sousa Tavares é (mesmo quando não se gosta dele) sério e valente, intelectual e até fisicamente...»

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Mais alunos no ensino superior

Mais uma achega para mostrar que António Costa errou estrondosamente ao reclamar os louros pelo aumento do número de alunos admitidos no ensino superior: Não só, como eu disse, o aumento já ia no terceiro ano, tendo a recuperação tido início em 2014, durante o governo de Passos Coelho, como a anterior redução do número de alunos começou durante o governo de José Sócrates. Não foi só um tiro no pé, foram dois, fora os outros que apontei. Agradeço a'O Insurgente ter chamado a atenção para este aspecto que eu tinha deixado passar.

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Um país sem salários

António Costa regozija-se com o aumento do número de alunos colocados em cursos universitários na 1.ª fase. É natural, é uma boa notícia e só fica bem ao PM reconhecê-lo. Mas os termos em que o fez tocam o delírio: "O aumento do número de alunos no ensino superior representa a morte do modelo de desenvolvimento que a direita quis impor neste pais, de um país sem salários, sem direitos e sem Estado Social". Em primeiro lugar, não se vislumbra a relação entre o aumento do número de alunos no ensino superior e as características de AC julga definirem o modelo da "direita". Se é certo que as dificuldades financeiras podem dificultar as famílias a investir na educação superior dos seus jovens, não foi o "modelo de desenvolvimento da direita" que causou essas dificuldades financeiras, mas a bancarrota que o PS provocou, pelas políticas de José Sócrates, e as exigências que constavam do acordo que o PS negociou com a troika. Em segundo lugar, o aumento de alunos verifica-se há 3 anos consecutivos, mesmo com o infame modelo da "direita". Os louros desse resultado não podem ser, portanto, atribuídos à política deste governo. Em terceiro lugar, quando AC fala de "um país sem salários, sem direitos e sem Estado Social" não pode estar a referir-se a Portugal. Os cortes nas remunerações dos funcionários públicos, por muito penalizadores que tenham sido, não podem ser comparados à ausência de salários, muito menos atribuídos a todo o País. A referência à ausência de direitos e de Estado Social, mesmo como uma imposição que a "direita" pretenderia, é um puro delírio.

Querer ficar com os louros do aumento de alunos no ensino superior, atribuindo este bom resultado à morte de um modelo de direita não resiste a uma rápida análise da realidade.

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Exigir é fácil

Exigir é fácil. Desde o miúdo que exige aos pais em choro ou aos berros um brinquedo tão caro que estes não podem comprar, até à CGTP que exige em conferência de imprensa e ameaça com "luta" um aumento de 4% nos salários e de pelo menos 40 € por mês a cada trabalhador (sem especificar se a exigência se limita aos funcionários públicos ou se engloba os trabalhadores de empresas privadas) e o aumento do salário mínimo para 600 € já no próximo ano. No que se refere ao sector privado, tudo depende da saúde económica das empresas, mas, como alertou ontem Brás Teixeira no programa Olhos nos Olhos, a exigência da CGTP, a ser satisfeita, teria impacte negativo na competitividade de Portugal, mormente nas empresas exportadoras. Mas limitando a análise ao sector público, onde é mais fácil fazer contas, é fácil verificar que, sendo o número de funcionários púbicos 473.446 (final de 2015), e sendo o seu salário médio 1621,20 euros, um aumento de 4% equivaleria a uma despesa adicional de 368 milhões de euros. Como parte desses funcionários ganharão certamente menos de 1000 euros, a despesa seria ainda maior, visto que para esses o aumento do mínimo de 40 € será correspondente a mais de 4%. No quadro da economia do orçamento para 2017, esta despesa adicional não parece fácil de acomodar. Exigir é fácil, mais difícil será aceder às exigências.

domingo, 4 de setembro de 2016

Dívidas

Como pode o PS, que não é capaz de se governar, querer governar bem o País. Está visto que a noção que o PS tem de boa gestão se baseia em aumentar as dívidas. É o que faz no próprio partido e o que vem fazendo a Portugal.