quinta-feira, 28 de julho de 2016

Sanções: zero = nada?

Em matemática está certo: zero = nada, mas em justiça comunitária não parece ser assim. Várias sumidades de política europeia passaram dias a explicar que uma sanção zero não era ausência de sanção, pois significava que se reconhecia que o país estava em falta por défice excessivo mas, para não prejudicar as finanças e porque a falta era ligeira se reduzia a sanção a zero, ficando como uma sanção simbólica ou um aviso. Uma coisa completamente diferente seria não haver sanção, pois deste modo se reconheceria que o país não estaria em falta ou pelo menos que a falta não merecia ser sancionada. Agora parece que esta distinção, que tão cuidadosamente nos explicaram, afinal não existe e os meios de comunicação apregoaram que não havia sanção e, simultaneamente, que a sanção era zero. Em que ficamos?

Houve mesmo que noticiasse que a sanção tinha sido cancelada. Ora só se cancela uma coisa que existe. Se não chegou a haver sanção, não pode ser cancelada uma coisa que não existe; se a sanção é zero, não foi cancelada, existe mas o valor é nulo. Mais uma vez, em que ficamos?

terça-feira, 26 de julho de 2016

Cruzes, canhoto!

Aí está uma proposta de saída do euro muito original e que pode ser um êxito, se conseguirem pô-la em prática. Visto no Quarta República, que também aplaude a ideia.

Dados económicos: luz e sombra

Os dados económicos referentes ao 1.º semestre de 2016 divulgados pela DGO têm provocado reacções tão diversas que não parece que se baseiam nos mesmos números. Cada um salienta os valores que mais favorecem a sua visão e tira as conclusões que melhor servem os seus propósitos. O Governo e o PS concluem que estes dados confirmam que a execução orçamental está bem, obrigado. A oposição olha mais para os dados específicos e para o que será de prever de agravamento para o 2.º semestre. O pobre contribuinte fica atrapalhado para saber quem tem razão. Quanto a mim, Miguel Sousa Tavares definiu de modo adequado a situação, ao dizer que "os dados divulgados são positivos do ponto de vista financeiro, mas são negativos sob o aspecto económico" (Apesar das aspas, cito de memória e as palavras podem não ter sido exactamente estas.) De facto, se for verdade que a execução orçamental corresponde a 52% do previsto para o total do ano, parece que está a correr bem. Mas é difícil achar a situação positiva quando se verifica que a receita da Administração Central cresceu, em relação ao período homólogo de 2015, apenas 3%, perante uma previsão de 4,9%, sendo que a receita fiscal aumentou 2,7% (previsto 3,5%), desta, a receita de IRC caiu 5,3% (previsto -1,1%) e a receita de IVA aumentou 0,4% (previsto 3,2%). Quanto à despesa, no total aumentou 0,6%, quando se previa 5,8%, sendo que desta, a rubrica de bens e serviços baixou 2,7% (previsto aumento de 1,7%) e, mais preocupante, o investimento diminuiu 19,5%, estando previsto não uma diminuição, mas um aumento de 14,8%. Se estes dados não são desastrosos, não sei como classificá-los.

(Dados do Público)

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Adeus, democracia.

O verdadeiro golpe de estado na Turquia está a ter lugar neste momento. Erdogan aproveitou o abortado golpe militar (ou a inventona que se quis fazer passar por um golpe falhado) para fazer, com toda a aparência de legalidade, o verdadeiro golpe. Se prendeu milhares e despediu mais milhares antes de declarar o estado de emergência, calcule-se o que poderá fazer ao abrigo deste. A democracia formal e imperfeita que antes existia na Turquia perdeu a máscara e com ela o princípio de laiciade instaurado há mais de um século por Kemal Ataturk. A instauração que se prepara da pena de morte ajudará neste processo e quase ninguém se admira que Erdogan se prepare para a tornar retroactiva. Algumas vozes se têm feito ouvir contra a pena de morte, mas, pelo visto, não parece conveniente que responsáveis políticos de países democráticos se pronunciem sobre a transformação de um país formalmente democrático numa verdadeira tirania.

Será intencional?

Se o Governo, ou António Costa, ou Mário Centeno quisessem desvalorizar o Novo Banco, qual seria a melhor maneira? Era, de certeza, anunciar que tinham grande preocupação com a situação do banco, que provavelmente não seria possível vendê-lo e que admitiam que poderia a curto prazo, digamos em 1 ano, proceder à sua liquidação. Conhecida a história do BANIF, mesmo com as enormes dúvidas que ainda subsistem sobre o que aconteceu e porquê, é evidente que perante tal anúncio os eventuais interessados na compra teriam bons argumentos para baixar significativamente o valor das suas ofertas. A única diferença para o BANIF é que a eventual liquidação, agora mais provável depois do seu anúncio, tem o prazo de 1 ano e não de 1 dia, mas, apesar desta diferença muito importante, o Novo Banco tem hoje menos valor e menor possibilidade de sobrevivência do que tinha ontem. Não haverá, creio, corrida aos levantamentos, mas é de prever que pouco a pouco, no decurso do prazo indicado, os depósitos e outras aplicações irão diminuindo. Quem será tão descuidado que deixe valores consideráveis à guarda dum banco ao aproximar-se a data em que foi anunciada a sua possível liquidação. Nem o Fundo de Garantia de Depósitos poderá evitar esta tendência.

Outra questão é saber se o envio por carta destas preocupações e previsões para a Comissão Europeia, sabendo que tudo seria do domínio público em pouco tempo, foi consequência de pura incompetência ou fruto de qualquer plano maquiavélico cuja finalidade não vislumbro. De qualquer modo, responsáveis competentes e honestos não o fariam.

terça-feira, 19 de julho de 2016

Ainda a propósito de ódio

Além dos potenciais atacantes, sempre difíceis de adivinhar quem são, os apelos para evitar o ódio também podem ser apropriadamente dirigidos ao Presidente turco, Erdogan. O golpe de estado falhado, seja genuíno ou uma inventona, está sendo transformado numa reacção de tal modo despropositada (já com 13000 presos) que mais do que defesa da sua posição só pode ser causada pelo ódio.

Ódio

Perante o choque do ataque de Nice, sucederam-se as declarações cheias de adjectivos, como é norma nestes casos. Quanto a mim, a declaração mais escusada e menos apropriada para a trágica situação foi a do Presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, apelando à França para não ceder "às tentações da divisão e do ódio". O ódio é sempre odioso, inútil e muitas vezes dirigido de modo indiscriminado. O ódio é sempre indesejável e deve ser evitado e criticado, mas fazer este apelo quando não são conhecidos apelos ao ódio ou reacções violentas, parece que não era à França que o apelo deveria ter sido dirigidos, mas antes aos potenciais atacantes que têm demonstrado um ódio indiscriminado que não poupa ninguém. Se não foi o ódio que guiou o camião que em Nice ceifou vidas de franceses, estrangeiros, cristãos, muçulmanos e porventura crentes de outras religiões e ateus, se não foi o ódio que brandiu há pouco o machado num comboio na Baviera, como chamará Schulz e este ímpeto irracional? Senhor Martin Schultz, não dirija o seu apelo à França nem aos outros países que têm sido vítimas destes actos de ódio, procure antes os verdadeiros agentes do ódio..

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Provérbios

É bem conhecido o provérbio "A rico não devas e a pobre não prometas". António Costa, pelos vistos, não o conhece ou, se o conhece, não o segue. Sabe quanto o País que ele governa deve aos investidores internacionais, que serão certamente bastante ricos para arriscarem investir em dívida soberana de um país fortemente endividado. Ao enveredar por uma política económica de reposição de rendimentos e de aumento de consumo, suportando em consequência défices mais elevados, está conscientemente a aumentar, ou pelo menos a não reduzir tanto quanto seria possível, a dívida. Quanto ao segundo conselho do provérbio, sobre não prometer aos pobres, é evidente que não o segue minimamente. Pior, promete mais do que o que pode dar. O aumento de rendimento está incidindo principalmente sobre os funcionários públicos e os contribuintes dos maiores escalões do IRS e não sobre os pobres. As pensões mínimas tiveram aumentos que mal dão para um café por mês. A redução tão propagandeada das taxas moderadoras na saúde foi, pelo menos num caso meu conhecido, de 7,50 euros por consulta para 7,00 euros.

Além deste provérbio, há um dito, norma citada da Bíblia (Lucas 16:13), que diz: "Ninguém pode servir a dois senhores". Ao prometer cumprir as normas da UE e do Tratado Orçamental e, ao mesmo tempo, não desrespeitar o que acordou com os partidos de esquerda comunista nem lhes desagradar para não perder o seu apoio, António Costa está enveredando por um caminho que mais tarde ou mais cedo o levará a uma situação completamente insustentável.




A sabedoria do povo deve ser tida em conta. A da Bíblia é muitas vezes fundamentada na experiência dos povos e não deve também ser desprezada.

Cabelo e governação

O fosso entre pobres e ricos, as desigualdades de rendimentos e as injustiças sociais são constante assunto de debate. Mas por vezes o que choca não é a desigualdade, é a pouca diferença de rendimentos entre quem, por um lado, tem poucas responsabilidades e faz um trabalho que pouco contribui para o bem comum e quem, por outro, tem enormes responsabilidades e de cujo trabalho dependem milhões. Há dias, perante a notícia de que a Chanceler alemã Angela Merkel tinha o miserável salário mensal de 18 000 euros fiquei admirado e até chocado. Mesmo para os que criticam o poder da Chanceler e as políticas que segue, suponho que ficarão surpreendidos com a exiguidade deste salário, principalmente quando comparado com os dos grandes chefes de empresas. Outra notícia que chocou em sentido contrário foi a que revelou o ordenado, superior a 9000 euros, do cabeleireiro do Presidente Hollande. A comparação deste salário com o da Chanceler alemã só pode surpreender. A explicação de que o cabeleireiro é privado e está de serviço 24 horas por dia não explica nada. O meu cabeleireiro cobra 12 euros por um corte de cabelo com lavagem, o que me parece um preço razoável. Supondo que esta operação demora uma hora, se eu exigisse que ele estivesse 24 horas por dia e 30 dias por mês a cortar e pentear o meu cabelo deveria pagar-lhe 12*24*30=8640 euros por mês, mas é evidente que esse horário, além de ilegal, é absolutamente absurdo. Um cabeleireiro ganhar mais de metade do que ganha a chefe máxima de um grande país não é razoável, qualquer que seja o dono do cabelo que ele serve e qualquer que seja o seu horário ou a sua ausência de horário.

terça-feira, 12 de julho de 2016

Estratégias

A questão da possível e cada vez mais provável aplicação de sanções a Portugal por parte da UE como castigo pelo défice excessivo tem sido noticiada, falada, comentada, explicada e repetida até à náusea. Mas todas estas notícias, falas, comentários e explicações pecam por contradições e contêm indícios de inexactidões, nos seus aspectos financeiros, políticos e de justiça. Não fora tratar-se de uma questão que, conforme o que resultar, pode ter importantes consequências para Portugal, e mais valia deixar os jornalistas, comentadores e políticos a falarem. Até como já tudo foi dito e o seu contrário, é com certa relutância que me atrevo a pegar no assunto.

Do que sobre esta questão já foi dito, o que mais me impressiona é a questão da diferença entre os diversos discursos e as estratégias que deles resultam. O discurso do Governo e do PS baseia-se em duas premissas: 1) O défice excessivo que se pretende castigar respeita ao período 2013-2015 e portanto não diz respeito a esta Governo. 2) Para efeito da sanção sobre o défice de 2015, que admite que tenha sido realmente excessivo (3,2%), não faz sentido apreciar a situação de 2016, que aliás está a correr bem e de acordo com os documentos aceites pela Comissão. De acordo com estas premissas, que são muito discutíveis, não se pode corrigir o passado e daí António Costa afirmar que não tem sentido pedir que se corrija o incorrigível. A estratégia baseia-se portanto em tentar justificar o pequeno desvio do défice, de 0,2 pp, pelas circunstâncias excepcionais em que ocorreu e afirmar que as contas de 2016 estão a correr bem. Portanto não se justificam nem serão submetidas à UE novas medidas nem qualquer plano B.

Esta posição contrasta com a do PSD e do CDS, que afirmam que os cálculos correctos do défice de 2015 apontam para um valor de 2,8%, visto que além do apoio ao BANIF há outras medidas extraordinárias de apoio à banca que deveriam ter sido tomadas em conta. Contrasta também com a posição que, no seu caso, foi tomada pelo Governo espanhol, apresentando imediatamente novas medidas. Contrasta por fim com o discurso do Presidente do Eurogrupo que afirmou várias vezes que são indispensáveis novas medidas. A lógica para este pedido está em que, apesar do reconhecimento do défice excessivo do ano passado, a sanção pode não ser aplicada se se mostrar que este ano a situação será corrigida. Suponho que ainda muita gente se lembra que a necessidade de novas medidas de contenção orçamental foi afirmada pela primeira vez logo depois da apresentação do PEC e do Plano de Reformas e que o Ministro Centeno chegou a prometer a sua apresentação, ao contrário do que afirma agora para não mostrar mais uma discordância com o que diz o Primeiro Ministro. Temo que a estratégia que Portugal vai seguir para procurar contrariar as sanções não seja ganhadora. Talvez, apesar disso, a Comissão opte por uma sanção zero, mas há um risco apreciável de que tal não seja possível.

domingo, 3 de julho de 2016

Negócios

Entre outras coisas, o ainda director, se bem que suspenso, do Museu da Presidência da República, é acusado do crime de "participação económica em negócio", Este crime constitui para mim um mistério, seja alegadamente praticado por um director de museu ou por outra pessoa qualquer. E causa-me algum receio de poder vir a ter problemas com a justiça. É que ainda ontem fui à padaria comprar pão. Pedi o pão que pretendia, perguntei quanto era, puxei da carteira, retirei uma nota que entreguei à simpática empregada da padaria, recebi o pão, o troco e o talão e retirei-me despreocupado trazendo o pão, o troco e o talão para casa. Ora o acto de alguém vender e eu comprar pão é evidentemente um negócio. A descrição pormenorizada do acto assim o prova. A minha participação no negócio, ao pagar e ao receber troco foi, não é possível negá-lo, uma participação económica. Portanto eu, como o ainda director do Museu da Previdência da República, tive uma participação económica em negócio. Ou me explicam muito bem em que consiste o crime, ou tenho de afirmar que tudo o que contei atrás foi pura invenção minha e que na verdade nunca comprei pão nem qualquer outra mercadoria.