quinta-feira, 30 de junho de 2016

Maiorias e minorias

No referendo britânico sobre a saída ou permanência na União Europeia, os defensores da saída (leave) ganharam por uma curta margem, mas ganharam. Este facto está a gerar as vagas alterosas, qual tsunami, de que vamos tendo notícia e vai ter uma enorme influência na vida dos britânicos, tenham votado dum ou doutro modo, e, em menor grau, dos europeus que nem puderam votar. Mas maiorias são maiorias e a democracia obriga a que sejam respeitadas. Todos sabemos de consequências desastrosas, pelo menos na nossa opinião, de decisões tomadas democraticamente.

Porém este caso tem, ao que me parece, uma peculiaridade que merece ser ponderada. Os resultados que foram divulgados dizem que o leave ganhou por 51,89%, portanto uma pequena mas clara maioria que é preciso respeitar. Será assim? Quanto a mim, não é. A comparência às urnas foi de 72,21%. Isto significa que o a vitória do leave resultou do voto de 51,89 x 71,21 = 37,5%  dos cidadãos com direito a voto. Ora se 51,89% é uma maioria dos votantes efectivos, já 37,5% é uma minoria da totalidade dos votantes. A regra de que os abstencionistas não contam é justa quando o que está em jogo é escolher entre dois candidatos (ou mais), sejam pessoas ou partidos. Mas quando a escolha está entre deixar tudo como está ou alterar a situação de um modo que terá consequências sobre todos, já parece que a justiça dessa regra é menos evidente. Por isso há em geral regras que tornam não vinculativos ou não válidos referendos em que o voto que determina a mudança de uma situação anterior se não se ultrapassar um determinado limiar de concorrência ou de votos na mudança. Foi um enorme erro de Cameron não ter legislado nesse sentido. Se uma abstenção de 28,79% não parece enorme, quando a diferença entre o sim e o não é pequena resulta que uma minoria impõe a uma maioria a sua decisão.

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Saturação

As nossas queridas TVs estão apostadas em fornecer doses maciças de futebol. São comentários antecipando os jogos, são transmissões dos jogos, são comentários sobre os jogos já jogados, são os momentos mais marcantes dos jogos são as tabelas, são os horários, são as opiniões dos fãs, são as transmissões das fans zones, são as listas dos onzes, ele é o euro2016, ele é a copa América, ele é futebol nos noticiários, ele é futebol a substituir programas habituais, ele é futebol de manhã, à tarde e à noite. Irra que é demais! Até temos um Presidente da República que comenta futebol! O Professor Marcelo Rebelo de Sousa já me irritava quando entre comentários políticos e outros assuntos sérios aproveitava o seu lugar de comentador para discorrer sobre a actualidade futebolística, como se não houvesse programas próprios para isso com ilustres comentadores especialistas em futebol, mas agora, como PR é não só irritante como, direi mesmo, despropositado. Estou saturado. Estou desejando que o euro acabe (não a moeda, claro), para ver o tempo dedicado a futebol nos meios de comunicação reduzido ao habitual, que para mim já é demasiado.

sábado, 18 de junho de 2016

Critérios de programação na RTP

Desde há algumas semanas a RTP transmite todos os Domingos duas séries nacionais de elevado interesse histórico. Até aqui, tudo bem. Uma das séries intitula-se "Antes da PIDE" e é transmitida na RTP2. Descreve com o auxílio a documentos da época, os aspectos que as várias polícias políticas que os governos foram criando tomaram com diferentes nomes e siglas. Amanhã será transmitida das 21:36 às 22:30. A outra tem o título de "Portugal no Século XX" e é transmitida na RTM-Memória. Como o nome indica, descreve com algum pormenor a história de Portugal desde o início do século passado. Amanhã está programada para passar das 21:03 às 21:54. Como se vê, coincidem em grande parte do tempo de transmissão. E é assim, mais minuto menos minuto, todos os Domingos. Não é possível ver as duas a não ser que se grava uma para ver mais tarde. Nem toda a gente tem meios para gravação de vídeo. Se alguém tiver interesse em gravar as duas para conservar, o que pode ser o caso das pessoas que especialmente interessadas em História, só muito raros telespectadores terão meios para gravar ambas.

Não sei quem é o responsável pela programação na RTP. Será que cada canal faz a sua programação sem ter conhecimento do que transmitem os outros canais? Não haverá uma coordenação? Ainda ninguém deu pelo inconveniente da coincidência?

quinta-feira, 16 de junho de 2016

A fábula da ventoinha e a CGD

É conhecido o dito popular de que não se deve pôr porcaria (a palavra no verdadeiro dito popular é mais forte e mal cheirosa, mas não gosto de conspurcar o meu blog) em frente de uma ventoinha, pois é certo que a porcaria será espalhada em abundância sobre o ambiente, que pode incluir o próprio autor da acção. Bagão Félix referiu-se a este dito criticando a proposta do PSD de criar uma comissão parlamentar de inquérito à CGD, por temer que provoque um espalhar de lama nas redondezas. Claro que delicadamente referiu lama, mas sabemos a que se queria referir. Pois bem, é possível que o inquérito à CGD espalhe alguma ou mesmo muita lama que venha a enlamear muitos dos seus gestores ou dos que tiveram responsabilidades na Caixa, mas se for o caso é porque existe muita lama lá dentro. Que advoga então Bagão Félix? Que se deixe a lama quietinha, como se ela não existisse? Quando a ventoinha salpica de porcaria os indivíduos que a rodeiam, de quem é a culpa, de quem liga a ventoinha ou de quem pôs a porcaria em frente da ventoinha?

domingo, 12 de junho de 2016

Desigualdade

Eu já desconfiava que as acusações de que a desigualdade, o fosso entre os ricos e os pobres, como é mais comum dizer-se, aumentou durante o Governo PSD/CSD-PP, não eram justas. Tornou-se normal afirmar que a austeridade atingia principalmente os mais pobres e que, em consequência, os ricos estavam cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. Eu desconfiava que não era verdade, mas faltavam-me argumentos matemáticos para poder ter a certeza. Eis que O Insurgente publica um gráfico da variação do índice de Gini no período entre 2003 e 2014 que mostra claramente que a desigualdade não aumentou desde 2011. E se tivesse aumentado, não teriam sido certamente as medidas de reversão tomadas pela geringonça a corrigir a situação, já que privilegiaram principalmente os funcionários públicos e os pensionistas mais bem pagos. Isto resultou exactamente por Passos Coelho e os seus Ministros das Finanças terem tido o cuidado de fazer incidir as medidas de consolidação orçamental preferencialmente sobre aqueles, poupando mais os de menores rendimentos.

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Contra factos não valem as previsões

É conhecido o velho provérbio que afirma que "contra factos não há argumentos". António Costa, ao dizer que prefere factos a previsões, parece querer descredibilizar as previsões desfavoráveis, menos credíveis ainda do que eventuais argumentos. Parece muito convencido que os factos mostram a bondade do seu Governo. Talvez tenha em mente algum facto mais favorável, mas dificilmente poderá considerar que factos como um défice de 3,3% estimado pela UTAO para o primeiro trimestre ou um crescimento em cadeia de 0,2%, correspondente a um crescimento homólogo de 0,9%, segundo dados do INE, são factos de que se possa orgulhar.

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Diferentes noções de democracia

Quando se fala de democracia, nem todos falam da mesma coisa. Apesar da sua raiz etimológica ser clara, o conceito tem merecido interpretações diversas e mesmo divergentes. A democracia ateniense, considerada a mãe de todas as democracias, ao limitar o seu âmbito aos cidadãos livres e do sexo masculino, podia ser muito perfeita, mas era, segundo os conceitos actuais, limitada e discriminatória. As chamadas democracias populares de inspiração soviética eram a negação absoluta do conceito ocidental de democracia. Salazar chamava ao Estado Novo uma democracia orgânica, por se basear, mais em princípio do que na realidade, nas corporações. A democracia chamada ocidental, a que é seguida na Europa, na maioria dos países americanos e se tem espalhado pelos outros continentes de modo mais ou menos perfeito, que se pode considerar baseada na Magna Carta, por um lado, e nos princípios iluministas que levaram à Revolução Francesa, é a que mais se aproxima do ideal da Grécia antiga, tendo aperfeiçoado os seus métodos e a sua abrangência. No entanto, os defensores da democracia popular e das políticas de extrema esquerda, designam a democracia ocidental  depreciativamente, como "democracia burguesa" e trabalham arduamente para a destruir.

Só neste quadro de subjectividade se pode compreender a frase que ouvimos recentemente ao Primeiro Ministro António Costa: "O PS devolveu a democracia ao País!" Das duas uma, ou António Costa pensa que foi o PS que provocou o 25 de Abril ou então considera que durante o Governo anterior da coligação PSD-CDS/PP não vivíamos em democracia. Que conceito tem AC de democracia. Será que pensa que por chamar a colaborar no poder partidos que são contra a nossa democracia, contra a "democracia burguesa", terá um País mais democrático? Parece-me que o mais provável é que António Costa não pense bem no que diz, como tem sido evidente noutras ocasiões em que se ouviram disparates semelhantes.

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Portugal foi invadido? Não, apenas confusão de números!

Li com espanto num roda-pé das notícias de um canal de TV a seguinte frase:"Portugal tem mais cidadãos activos estrangeiros do que nacionais". Se tivesse acreditado teria ficado em pânico; ter mais estrangeiros do que nacionais a trabalhar em Portugal significaria que tínhamos perdido a nossa autonomia, que o País tinha sido invadido, não por um exército, mas por multidões de trabalhadores. Mas vi logo que não era possível, era necessário ter havido uma entrada tão numerosa de estrangeiros que ouviríamos em qualquer lugar falar mais línguas estranhas do que português.

Uma consulta breve de algumas estatísticas públicas revelou que a população activa em Portugal era, segundo o censo de 2011, de 5 554 800 pessoas. Por outro lado o número de residentes estrangeiros era, no mesmo ano, 394 496 indivíduos. Logo, mesmo que 100% dos estrangeiros estivessem a trabalhar, a percentagem de estrangeiros entre a população activa residente não poderia passar de 7%, muitíssimo longe da maioria.

Verifiquei que a frase que me tinha suscitado tantas dúvidas aparecia (no Google) como noticiada pela TVI, mas o link revelou que a notícia tinha sido retirada. Por outro lado, a TSF mantinha um título semelhante. Lida a notícia completa, verifiquei que o jornalista que redigiu o título confundiu taxas de actividade em ambas as populações residentes, os estrangeiros e os nacionais, com o respectivo número absoluto. Assim, a taxa de actividade entre os estrangeiros residentes em Portugal é superior à dos nacionais. Mas no próprio corpo da notícia da TSF afirma que "a maioria da população activa é oriunda de países fora da UE" sem especificar que se refere à população activa estrangeira. Um pouco mais de rigor na redacção das notícias e dos títulos evitaria casas como este.

quinta-feira, 2 de junho de 2016

A destruição de um país

 É possível destruir um país. Está acontecendo.
Notícias da Venezuela. Para ler e meditar.

quarta-feira, 1 de junho de 2016

O copo meio cheio de António Costa

Desde sempre me considerei a mim próprio um optimista consciente mas determinado. Sempre tive tendência a ver o lado positivo das coisas, sem descurar as precauções necessárias para neutralizar ou evitar o lado negativo que as mesmas coisas possam apresentar. Confesso que nos últimos anos e principalmente nos últimos meses o meu optimismo tem vacilado bastante. Além disso tenho sentido uma irritação crescente pelo optimismo a meu ver injustificado de alguns dirigentes políticos. Estou assim de acordo com Marcelo Rebelo de Sousa quando fala no optimismo ligeiramente irritante de António Costa (Designo propositadamente ambos pelo nome e não pelo cargo, já que não se trata de posições oficiais). Bem sei que MRS se referia a uma recordação antiga; para mim é uma realidade perfeitamente actual e até eliminaria a classificação de "ligeiramente".

Mas tudo o que é demais é demais, como dizem os ingleses e diria La Palisse. E acho que agora António Costa, ou melhor, neste caso o Primeiro Ministro, exagerou ao não se mostrar nada incomodado pelas previsões da OCDE, que vêm confirmar outras previsões muito preocupantes que põem em dúvida as políticas económicas do Governo, chegando o PM a manifestar contentamento por nenhuma entidade ter até agora previsto um défice superior a 3% para este ano. Tendo em conta que a OCDE prevê um défice de 2,9% e ainda por cima considera que serão necessárias novas medidas de contenção (e a Moody's adiantou o valor de 3%), enquanto que o Governo mantém a sua previsão de 2,2%, é a primeira vez que alguém fica satisfeito por ver uma sua previsão tão posta em causa. Ainda por cima, para tentar esquecer a desgraça que se adivinha, o PM esquece as péssimas previsões para o crescimento do PIB e as anteriores de outras entidades, metendo com um sorriso a cabeça na areia.

Onde António Costa vê um copo meio cheio, eu vejo um copo meio vazio, apesar de me considerar optimista.