domingo, 3 de março de 2013

O Povo é quem mais ordena!

O Povo é quem mais ordena: É esta, em poucas palavras, a essência da democracia. Não só sou convictamente a favor da democracia (A democracia é o pior dos sistemas, excluídos todos os demais), como sou também um admirador da arte de José Afonso. Entre muitas outras, gosto da canção Grândola, Vila Morena, talvez por ser alentejano e o nome de Grândola estar entre as minhas memórias mais antigas. Cantar a Grândola, Vila Morena só pode ser entendido como um acto contra o actual Governo por um desvio ideológico que acha que as regras mais elementares da nossa Constituição não têm valor. No nosso regime de democracia representativa está definido claramente que o Parlamento depende de eleições e que o partido mais votado tem o direito de escolher o Primeiro Ministro que forma um Governo para uma legislatura, que por sua vez tem o direito de governar durante 4 anos desde que não se demita ou que o Presidente da República não o demita. Nada está previsto para o caso de o Governo não respeitar as promessas eleitorais. Mesmo que assim fosse, seria preciso determinar quem procederia à comparação entre o que se prometera e o que se cumpriu e quem decidiria pela destituição. Certamente não seriam os partidos da oposição a tomar essa decisão nem um grupo de manifestantes, por muito numerosos ou persistentes que fossem. A falta de legitimidade do actual Governo é uma falácia. Como é que o Povo exprime a sua vontade? Como é que ordena? Aos gritos nas ruas com cartazes em que exprime a sua vontade? Com manifestos e declarações? Não. É com eleições.

Mas mesmo admitindo que a partir de um determinado número de manifestantes contra o Governo, este se devia demitir, coisa absurda e que tornaria todos os países mais ingovernáveis do que é agora a Itália, vejamos os números. Nas eleições legislativas de 2011 o PSD obteve 2.179.742 votos e o CDS/PP 653.967. O actual Governo teve, portanto, um apoio de 2.833.709 votantes. Ora os organizadores da manifestação do dia 2 reivindicam um máximo de 1,5 milhões de participantes. Mesmo que este número fosse verdadeiro e mesmo que a regra enunciada acima fosse válida, estaríamos longe de ter o número mínimo necessário para impugnar o Governo. Mas, como várias vozes têm alertado, os números adiantados pelos organizadores são fantasistas. Em Lisboa, em vez dos 500.000 citados, os manifestantes seriam, quando muito 177.000 pessoas se o Terreiro do Paço, a Rua Augusta (ou a Rua Áurea), os Restauradores e a Avenida da Liberdade estivessem completamente cheios com uma multidão muito apertada (3 pessoas por metro quadrado), o que estava longe de acontecer. A afluência estaria mais próximo de metade daquele número: 88.000 protestantes. No resto do País a situação não deverá ser muito diferente, como aliás é norma na estimativa de participantes neste tipo de acontecimentos.

O Povo é quem mais ordena, mas não 88.000 pessoas não são o Povo, nem 177.000, nem 500.000, nem 1.500.000.

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