sábado, 29 de setembro de 2012

Austeridade e reacções

Não compreendo a surpresa e as reacções contra as medidas de austeridade anunciadas de modo muito geral e ainda vago e as que se adivinham. Claro que há muita gente, suponho mesmo que a maioria dos portugueses, que não compreendem ou não querem compreender que para passarmos a viver de acordo com o que produzimos a austeridade é inevitável. Claro que a manifestação de hoje organizada pela CGTP faz parte da luta política e a indignação contra as medidas de austeridade é um pretexto e uma maneira de mobilizar as pessoas. Mas já toda a gente sabia, porque tinha sido amplamente divulgado, que para reduzir o défice, a que éramos obrigados pelo Memorando de Entendimento que o anterior Governo negociou, mas que de qualquer modo seria necessário já que o financiamento dos sucessivos défices se tornara impossível, seriam necessárias em 2013 mais medidas de contenção de despesas do que nos anos anteriores. E em virtude do acórdão do Tribunal Constitucional esta medida teria de se reflectir também no sector privado. As medidas que se esperam para 2013, com TSU ou sem TSU, não deveriam portanto constituir qualquer surpresa, a não ser para os pouco informados. Desde o pedido de resgate que se sabe que os sacrifícios eram inevitáveis. Já se tinha afirmado e tornado a lembrar que 2013 seria um ano muito difícil, mesmo que se viesse a verificar nesse ano uma viragem na tendência para o aprofundamento da crise. Este viragem, que o PM previu, se se vier a dar, só terá efeitos nos anos seguintes. Por mim, como ainda será necessário baixar mais o défice para 2014, não me surpreenderei que mais sacrifícios venham ainda a ser pedidos. E, mesmo que tudo corra bem e o Governo tome as medidas mais adequadas, mesmo que possamos voltar aos mercados financeiros em 2013 ou em 2014, é evidente que os limites de endividamento terão de ser muito apertados, para não cairmos novamente na situação a que chegámos no ano passado. E independentemente do que se passe no nosso País e do nosso comportamento, o empobrecimento do Ocidente seguirá o seu rumo mais ou menos lentamente.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Lição magistral sobre a dívida

Sob o pretexto de contestar o artigo "A dívida existe mesmo?" de José Vítor Malheiros publicado no Público, jcd dá-nos no Blasfémias uma lição magistral sobre como se forma a dívida pública e as implicações desta. O artigo de José Vítor Malheiros é uma demonstração de ignorância absoluta. Claro que há muita gente que não sabe como se formou a dívida e que é impossível pagá-la urgentemente, quais as fontes que se podem consultar para saber quando se formou, quanto se deve, em que se gastou o dinheiro e o que se pode fazer para estancar a hemorragia, mas essa muita gente não escreve artigos no Público a expor a sua ignorância.

Muito justamente, o artigo de jcd é referido em vários blogs, mas não resisto a juntar-me a esse grupo.


terça-feira, 25 de setembro de 2012

Mais tempo custa mais dinheiro

A Grécia pediu, e está em vias de obter, mais 2 anos para conseguir cumprir as metas orçamentais. Mas agora chegou-se à conclusão de que esta extensão do prazo implica um financiamento de 13 a 15 mil milhões de euros. É lógico, mas espanta-me só agora se falar nisso. O Ministro da Finanças grego diz que crê não ser necessário sobrecarregar os contribuintes europeus. Espero bem que tenha razão.

Mas agora pergunto eu: Na 5.ª avaliação da troika ao programa de ajuste português foi autorizada a extensão por um ano do ajuste do nosso défice. Ninguém falou em financiamento complementar necessário por este adiamento. Então mais tempo na Grécia implica mais dinheiro, mas em Portugal não é assim? Porquê?

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Ninguém nos vai devolver nada

Ainda não se sabem pormenores das medidas de austeridade que serão adoptadas depois da reprovação da mexida na TSU. No entanto parece que ninguém ou quase ninguém se apercebeu que o abandono daquela mexida só afecta o défice em 7-5,75=1,25% do rendimento total dos trabalhadores do sector privado. Se se aperceberam disso, os comentários dos parceiros sociais e dos jornalistas não o dão a entender. Por isso o corte de parte ou da totalidade de um subsídio só teria de cobrir aquele diferencial. No sector público há apenas a substituição do aumento da taxa para a SS por um corte parcial de um dos subsídios, se entendi bem. Esperemos que as coisas se clarifiquem.

Há contudo um pormenor de linguagem que pode lançar alguma confusão. Quando ouvi um jornalista afirmar que um dos subsídios cortados aos funcionários públicos e aos pensionistas seria "devolvido", pensei que a expressão "devolvidos" não seria a mais correcta e que se devia a uma daquelas imprecisões de linguagem que são frequentes. No entanto, logo a seguir, ouvi o próprio Primeiro Ministro utilizar a palavra "devolução". Os mais incautos ou pouco informados poderão pensar que o Estado irá devolver o dinheiro cobrado ou não pago em 2012. Afinal não haverá qualquer devolução, mas sim a eliminação, em 2013, do corte de parte de um subsídio, isto é, uma diminuição em relação ao presente ano dos cortes no orçamento do próximo ano que está agora a ser discutido. Ninguém nos vai devolver nada.

domingo, 23 de setembro de 2012

Insultos

Saliento a frase de Graça Franco que ouvi anteontem: "Quem aceita governar nestas circunstâncias não merece que haja na rua quem insulte gratuitamente". É exactamente o que eu penso e logo que Passos Coelho aceitou ser indigitado para formar Governo pensei que, se tivesse a noção do que o esperava, mais valia recusar e manter-se afastado de funções políticas. Mais valia para ele; felizmente não cedeu a essa tentação. Ouvir agora multidões a gritar "Gatuno" e outros "elogios" faz-me lembrar as multidões que reclamavam cabeças durante a Revolução Francesa e particularmente durante o Terror. Felizmente agora não reclamam cabeças, a civilização evoluiu para formas de protesto menos drásticas, mas, por muito que possa haver erros de governação, continuo a acreditar na boa vontade destes governantes e parecem-me completamente injustos os insultos que se ouvem nas manifestações e em outras ocasiões.

sábado, 22 de setembro de 2012

Vamos ficar cada vez mais pobres

José Manuel Fernandes escreveu em 2009: "Não se iludam: vamos ficar cada vez mais pobres." E agora lembrou esta frase e mostrou que está ainda mais certa. No filme da BBC sobre os últimos dias do Lehman Brothers, o então Secretário de Estado do Tesouro dos Estados Unidos, Henry Paulson, diz: "É o fim do Ocidente!" (cito de memória). Não somos só nós, portugueses, que vamos inevitavelmente ficar mais pobres, são todos os europeus e, voltando a Paulson, os ocidentais. A presente crise pode não ser a última a levar-nos para um empobrecimento em termos absolutos e relativos, mas é um passo importante neste processo. E infelizmente creio que Portugal pode ser um dos países mais atingidos, dados a nossa dimensão, o nosso atraso tecnológico e a nossa baixa natalidade e consequente envelhecimento. O empobrecimento pode levar décadas, mas, a menos que ocorram circunstâncias inesperadas, é inevitável. Tudo o que podemos e devemos fazer é tentar retardar e aliviar as consequências deste processo, em nome das futuras gerações. Também eu preferia nunca ter escrito este texto ou, tendo-o escrito, ter errado completamente na previsão.

O estranho caso da ubiquidade do BE

Não há mais dúvida de que as TVs gostam do BE. Talvez porque acham que um partido assim, tão fora da corrente predominante, em que até o PCP se integra, traz mais audiências. Inclino-me mais para esta hipótese do que para pensar que a política preconizada pelo BE é a preferida entre os jornalistas que seleccionam os intervenientes nestes programas. As aparições de Louçã nos pequenos ecrãs (agora alguns não tão pequenos) são constantes e os novos coordenadores indigitados para o partido, um homem e uma mulher segundo o critério do coordenador cessante, também são presenças preferidas. Ontem, às 21:50 nos 3 canais informativos decorriam simultaneamente debates sobre a situação política e tivemos, em todos os canais, um deputado do BE, mas só o CDS teve tratamento semelhante. Na TVI24 João Semedo debateu com Nuno Melo; na SIC-Notícias foi Fazenda que discutiu com Nuno Magalhães. Nestes canais não só os restantes partidos estavam ausentes como deu-se importância igual a um partido muito minoritário (apesar de já ter tido maior dimensão eleitoral) e a um partido bem implantado e que participa no Governo. Só na RTP-Informação havia uma maior pluralidade: Ana Drago e António Filipe à esquerda, estando João Galamba à direita (?) com João Almeida e Campos Pereira. Não sou de opinião que tem sempre de haver sempre paridade de todos os partidos com representação parlamentar nem que tem de haver uma igualdade ou proporcionalidade milimétricas, mas a preferência de que goza o BE é evidente.

A notícia do dia


Leio no Quarta República:

«o saldo conjunto das balanças de bens e de serviços está virtualmente equilibrado»

Esta deveria ser a notícia do dia e ter prioridade sobre os debates no Parlamento, as reuniões do Conselho de Estado e as manifestações contra a troika, contra a TSU, contra os políticos ou contra tudo. Mas a nossa comunicação social ou nem dá por isso ou acha que não é mediático. São os tais critérios jornalísticos

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O pior ainda está para vir

Dou razão a André Azevedo Alves, no Insurgente:

«Quando foram anuciadas as mais recentes medidas de austeridade, escrevi que me pareciam um mal menor face à larga maioria das alternativas que vinham sendo discutidas, havendo no entanto poucas razões para optimismo.
Face aos desenvolvimentos que se seguiram, suspeito que o “recuo” forçado do Governo vai dar origem a medidas ainda piores para o país. Preparem-se para o agravamento da asfixia fiscal e para a cada vez mais provável ruptura do sistema.»

Eu sempre me considerei um optimista, mas agora cada vez vejo menos razões para conservar algum optimismo.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

TSU

Para dizer a verdade, os meus fracos conhecimentos de economia (uma cadeira semestral e algumas leituras desgarradas) não me permitem dizer se a medida de redução da TSU para as empresas com aumento para os trabalhadores (incluindo os funcionários públicos) é boa ou má, se tem mais vantagens ou mais inconvenientes. Mas confesso que quando ouvi o PM anunciá-la me pareceu positiva e não esperava o repúdio generalizado e, posso mesmo dizer, feroz que despertou em tão variados quadrantes, incluindo sindicalistas, responsáveis de organizações patronais e, o que é mais notável, personalidades do partido que lidera a coligação que apoia o Governo. Este repúdio tem sido considerado "unívoco", mas esta afirmação tem sido desmentida por algumas opiniões, não muito abundantes, é certo (assim de repente recordo uma notícia sobre a opinião de Ludgero Marques e a que ouvi há pouco de Helena Garrido). Mas há que distinguir os que são contra a medida no seu conjunto - aumento do desconto para os trabalhadores, redução para as empresas - e os que são a favor da redução para as empresas, mas não no aumento para os trabalhadores, sem terem em conta que as alternativas de financiamento da medida poderão ter, como afirmou hoje Carlos Moedas, efeitos piores. Felizmente leio agora um artigo de Anunes no blog SEDES que vem esclarecer aspectos em que um leigo como eu não tinha ainda pensado. Considera a medida 1) correcta, 2) oportuna e necessária e 3) corajosa; e explica porquê. Vale a pena ler na íntegra. Diria até que, mesmo os que criticam a medida, só têm a ganhar lendo o artigo.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Quantos eram (na manif em Lisboa)?

Já me habituei a desconfiar sempre dos números anunciados de participantes em manifestações. Desta vez, com a manifestação "Que se lixe a troika. Queremos a nossa vida.", a desconfiança foi grande perante o número apontado e acriticamente repetido de 500.000 participantes em Lisboa. Claro que as imagens mostravam que eram muitos, mas meio milhão não são muitos, teriam de ser muitíssimos.



Os maiores estádios de futebol têm capacidade para 50.000 a 70.000 assistentes, e estão sentados sem intervalos entre si. Outros também desconfiaram do número apregoado.

Dei-me ao trabalho de medir as dimensões dos locais em que a manifestação começou, por onde passou e onde terminou, usando para isso os mapas do Google e a respectiva escala. Aproximadamente a Praça José Fontana terá 7500 m2, a Rua Engenheiro Vieira da Silva uns 3600 m2, o troço da Fontes Pereira de Melo até ao Saldanha apenas 500 m2, o Saldanha deve ter 7854 m2, a Avenida da República até ao início da Av. Berna 20.250 m2 e esta última avenida, em todo o seu comprimento 17.000 m2. Por sua vez, a Praça de Espanha tem de 21.600 m2 a 25.375 m2 conforme se não contarmos com o espaço do terminal rodoviário ou se incluirmos este. No total teremos no máximo 82.079 m2. Ora, mesmo que os manifestantes enchessem integralmente todos estes espaços, o que não aconteceu nem acontece em manifestações que percorrem um percurso, para conter em todas estas artérias 500.000 pessoas, estas teriam de estar apinhadas numa razão de 6 pessoas por metro quadrado, o que é fisicamente impossível. As imagens passadas nas TVs apontam antes para uma média de 1 pessoa por m2 ou menos, atendendo aos espaços abertos entre os manifestantes. Além disso será de supor que, quando no final do percurso, encheram a Praça de Espanha, já a Praça José Fontana e pelo menos metade do percurso deveriam estar praticamente vazios. Estes dados levam a pensar que o número de manifestantes não seria superior a 41.000 e provavelmente muito menos. A estimativa de 500.000 só pode ter sido atirada para a comunicação social por vontade de enganar ou por erro grosseiro.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Quem deve pagar a crise?

É uma discussão antiga. Desde que há crises em Portugal, após o 25 de Abril, que se houve a velha palavra de ordem "Os ricos que paguem a crise!". Mais recentemente, o slogan é: "Quem causou a crise [entenda-se: os americanos, o capital financeiro internacional, os grandes bancos, os governos que tomaram medidas erradas, os partidos do arco do governo, a direita] que a pague!". Não se pode negar a justiça destas reivindicações. O problema é que são absolutamente inviáveis. Por muitos ricos muito ricos que existam em Portugal, e creio que não há muitos e que na sua maioria não são muito ricos, serão talvez riquinhos, as suas fortunas somadas não chegariam para pagar a crise. Mesmo que chegassem, não seria fácil obrigá-los a pagar; veja-se o que aconteceu no 11 de Março, em clima revolucionário; muitos emigraram e alguns foram presos, mas a "nacionalização" dos seus bens não teve como resultado o enriquecimento dos outros portugueses.

Outra frase corrente é que "são sempre os mesmos a pagar", sejam esses "mesmos" os trabalhadores, os trabalhadores e os pensionistas, a classe média ou todos os que não são ricos. A verdade é que os ricos não têm sido poupados à crise, simplesmente porque os seus activos, que constituem a sua riqueza - sejam acções, património imobiliário ou outros - têm sido fortemente desvalorizados. Claro que os ricos continuam ricos e continuam a viver bem, sem os problemas com que se defrontam muitos menos ricos: dificuldades em pagar a prestação da casa, as contas da água e da luz ou os remédios que vão buscar à farmácia, mas isso não quer dizer que não tenham sido penalizados, e por vezes muito, pela situação. Além disso, a grande maioria da população é constituída exactamente pelos trabalhadores e os pensionistas, portanto não pode deixar de ser que sejam estes, em que me incluo, que são sujeitos à maior parte dos cortes. Para poupar os muito pobres, a classe média não pode ser poupada, por muito que a classe alta, muito menos numerosa, pague proporcionalmente muito mais (tenha-se em conta o aumento do IMI, a taxa do último escalão do IRS, de 46,5% mais a taxa de solidariedade de 2,5%, a taxação agora anunciada de carros de alta cilindrada, de barcos de recreio e de aeronaves e de prédios de alto valor). Paga proporcionalmente mais, mas em valor absoluto muito menos, pois as taxas mais altas vão multiplicar-se por um número muito mais reduzido de contribuintes. Não é verdade que "sejam sempre os mesmos a pagar", mas por este efeito são sempre os mesmos a arcar com a maior fatia, pela simples razão do seu número.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Pão e circo: menos pão e mais circo

É sintomático que poucas horas após a apresentação pelo Ministro das Finanças de novas medidas de contenção do défice que foram quase universalmente criticadas com dureza e causaram indignação à esquerda e à direita, bastasse um resultado de 3-1 num jogo de futebol para que as nossas TVs, e estou em crer os respectivos telespectadores, passassem da indignação à manifestação de alegria, de orgulho patriótico e de esperança no futuro (do futebol). Sempre gostaria de saber se no Azerbaijão houve fenómeno simétrico correspondente e a derrota levou o povo, ou pelo menos as TVs, de um estado de orgulho no seu país para uma tristeza e indignação generalizadas.

sábado, 8 de setembro de 2012

Número de alunos por professor

David Justino acaba de publicar no Quarta República quadros que mostram a evolução do número de alunos por professor e uma comparação internacional deste dado. Altamente significativo... Este tipo de informação merecia uma divulgação generalizada. Embora o Quarta República seja um dos blogs com maior número de seguidores regulares, o que é bem merecido, é claro que a generalidade dos portugueses não tem acesso a estes dados. Concordo com o Ilustre Mandatário do Réu em como David Justino prestou um bom serviço público; só é pena que não seja também quem tem obrigação de prestar serviço público (e é pago para isso) que dá a conhecer estas factos a uma mais ampla audiência.

Austeridade e medidas

Ouvi, como todos os portugueses interessados no futuro - próprio e do País - a declaração do Primeiro Ministro sobre as medidas que pretende tomar no orçamento do próximo ano, normalmente chamadas "medidas de austeridade", embora nem todas sejam austeras em rigor. Como pensionista, claro que não tive razões para ficar contente, já que vou continuar a ter 2 subsídios cortados, ou seja, mantém-se um corte de 14% no meu rendimento. Como pai, lamento que os meus filhos também sejam afectados, quer pelo lado dos trabalhadores privados, que passam a ter agora os seus rendimentos também tocados, quer como funcionários públicos, que conservam os cortes, embora parcialmente por uma via diferente. Mas em geral pareceram-me medidas justas e adequadas, pelo que me dispenso de as criticar. Não estou em sintonia com o coro de críticas e lamento que os aspectos positivos tenham sido silenciados pelos comentadores. Por isso gostei de ler Carlos Faria no blog Forte Apache:


«O que não se fala sobre as novas medidas de austeridade

Contrariamente ao que se especulava há muito tempo sobre o provável aumento da austeridade já este ano para cobrir o desvio do défice de 2012, nada foi anunciado e os especuladores desse boato não assumem o seu falso prognóstico, nem os OCS que deram cobertura a tal especulação fazem agora um mea culpa.
O aumento da taxa para 18% na segurança social é aplicado 14 vezes nos privados, o que dá de facto a quase perda de um salário ou subsídio (98%), mas é de apenas 12 vezes na função pública, pois o subsídio é reposto por duodécimos, o que deve equivaler a um corte de 91% (84+7 sobre o duodécimo). Logo por esta via não é linear o corte dos dois subsídios integralmente.
Não se fala do crédito de IRS a atribuir aos salários mais baixos, aspeto que mostra preocupações sociais neste governo, não só por este pormenor não estar devidamente quantificado, mas talvez por não importar a alguns evidenciar esta circunstância de justiça para com os mais desfavorecidos.
Não se fala também, porque se desconhece em pormenor, como serão implementadas outras medidas sobre outros rendimentos conforme o Primeiro Ministro deixou claro no discurso, mas já se diz, sem se saber, que não há austeridade para os ricos e os rendimentos de capital.
Não se fala ainda, porque também se desconhece em pormenor, os efeitos das alterações de escalão de IRS, mas já se diz que vai ser desfavorável aos trabalhadores, o que é admissível, mas é ainda mera especulação.
Em resumo: as medidas são de austeridade, mas com uma comunicação social amiga procura-se branquear os aspetos que evidenciem preocupações sociais, especula-se sobre injustiças que ainda se desconhecem e ainda apaga-se da memória as especulações negativas exageradas que já se propagaram como se nada tivesse sido dito

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

A culpa é sempre dos outros, claro.

A falta de tripulantes em voos da TAP levou a companhia a efectuar voos em que não foram servidas as habituais refeições, já que foi julgado preferível "não servir refeições uma vez que o voo se realiza com a tripulação mínima". Segundo a RTP "O Sindicato acusa a TAP de, sem necessidade, ter deixado os passageiros com a barriga a dar horas em 84 voos". É preciso ter lata: A decisão de realizar os voos mesmo sem serviço de refeições foi tomada para evitar o cancelamento dos voos, que certamente seria muito mais desagradável e inconveniente para os passageiros. A "falta de tripulantes" não é da responsabilidade da companhia, mas sim dos tripulantes faltosos.

A notícia adianta que entre os passageiros se contavam vários eurodeputados. Bem, são gente como os outros, e felizmente que não tiveram tratamento de favor.

Queixinhas

Fiquei verdadeiramente surpreendido com a acusação feita pelo BE, depois da reunião dos partidos com a troika, de que os partidos do Governo, PSD e particularmente o CDS-PP, teriam pedido mais tempo e mais dinheiro para o ajustamento orçamental português. A minha surpresa não veio do objecto da acusação, que foi prontamente desmentida (e pode ser verdade ou não), mas sim do simples facto de ter sido efectuada. É a primeira vez, que me lembre, que depois de uma reunião, uma das partes vem dizer o que outra disse, em vez de se limitar a revelar o que disse ela própria. Suponho ser uma norma elementar de boa convivência democrática e de boa educação, mesmo fora do universo da política, que não se revelem as posições que outras partes tomaram em reuniões não públicas, sobretudo com o intuito de acusar posições com que não concorda. Seria bonito que depois da reunião entre Passos Coelho e Seguro ou entre o PM e o PR cada um tivesse vindo dizer o que o outro disse e o que respondeu. Tenho apreciado, por exemplo, como, após audiências com o Presidente da República, os intervenientes, quando fazem declarações, se limitam a relatar o que disseram, calando o que o PR lhes terá dito. Espero bem que esta atitude incorrecta do BE não se torne um hábito; seria um muito mau hábito.

sábado, 1 de setembro de 2012

Que confusão!


Do blog O Princípio da Incerteza:

A notícia caiu como uma bomba, certeira, apontada com pontaria para atingir, ao que parece, o encerramento da Universidade de Verão do PSD:
A UTAO estima para o primeiro semestre um défice, na contas nacionais, de 6,9%, o que torna ao Governo praticamente impossível atingir no fim do ano a meta de 4,5%.

Para compreender bem o alcance da notícia ouvida na TV (praticamente em todos os canais informativos nacionais), procuro a fonte original. A LUSA, citada como fonte pelo Diário Digital, já não tem a notícia em linha (para quem não compreenda o que significa "em linha", esclareço que é em português o mesmo que "on line" ou "online" em inglês). Assim limito-me a ler a notícia em segunda mão, não só no Diário Digital, mas também no Negócios online. Segundo estes órgãos de comunicação: «O défice orçamental no primeiro semestre do ano ter-se-á situado nos 6,9%, calcula a Unidade Técnica de Apoio Orçamental» no parágrafo guia (lead) da notícia. Mas ao procurar o desenvolvimento, em ambos os periódicos, não consigo mais encontrar qualquer referência às contas do primeiro semestre. O que vejo são referências a um «relatório sobre a execução orçamental dos sete primeiros meses do ano», sem dados quantitativos relativos a este período, e ao «primeiro trimestre do ano» no qual o défice em contabilidade nacional se teria «situado entre os 6,7% e os 7,1%». Esta última referência, aliás, não é nova: Já em Julho, a mesma UTAO, assinalara «que o défice do primeiro trimestre "se encontra ainda distante da meta orçamental para 2012" e o INE revelara, para esse período, um valor do défice orçamental muito pior, de 7,9%.

Ficam as dúvidas:
Que diz a UTAO no último relatório sobre os 7 primeiros meses do ano?
Porque não se refere o corpo da notícia ao valor de 6,9% do primeiro semestre referido apenas no parágrafo guia, que costuma ser um introdução ou um resumo da notícia e não conter o dado mais importante sem que este seja desenvolvido ou explicado mais adiante?
A que propósito se cita agora, já em Setembro, um valor relativo ao primeiro trimestre que é diferente do divulgado pelo INE em devido tempo (será pela diferença entre défice orçamental e défice na contabilidade nacional)?
Porque se mistura na mesma notícia citações de 7, 6 e 3 meses?