quarta-feira, 30 de março de 2011

Iodina

Bem sei que no meio de tantos problemas domésticos e internacionais é quase escandaloso eu escolher fazer notar hoje um pequeno problema de nomenclatura que é simultaneamente um erro de tradução, mas como químico e tradutor não resisto a assinalar o facto. Hoje, no canal Euronews, que costuma ser rigoroso na versão portuguesa das notícias, a propósito do acidente nuclear da central de Fukushima, o jornalista português referiu-se ao perigo da "iodina", falando, mais adiante na "iodina 131 radioactiva" que se encontrou na água do mar perto da central. Ora "iodina" é o nome duma planta (Iodina rhombifolia). O isótopo radioactivo que tem sido encontrado nas águas do mar perto de Fukushima é o iodo 131. O iodo é um elemento químico, de número atómico 43 na Tabela Periódica. Uma má tradução do inglês iodine terá levado a este erro. É certo que o Dicionário Cândido de Figueiredo inclui "iodina, f. (V. iodo)" por a palavra aparecer no lugar de iodo em alguma literatura brasileira. Mas em português de Portugal o nome correcto do elemento químico de símbolo I continua a ser iodo. E não há acordo ortográfico que mude as palavras. Note-se que a versão portuguesa da Euronews nunca empregou, que eu tivesse dado por isso, brasileirismos, pois se destina a ser difundida em Portugal e não no Brasil.

quinta-feira, 24 de março de 2011

Há défice para além da vida?

Já sabemos que, segundo Jorge Sampaio nos elucidou, há vida para além do défice, embora seja uma vida em crise financeira permanente e a precisar de um bailout, acrescento eu. Mas será que há défice para além da vida? Não sei, mas parece que há défice de 2010 para além de 2010. Para mim a notícia mais inquietante do dia não foi o chumbo do PEC nem o pedido de demissão do PM: Foi a notícia das dúvidas do Eurostat sobre o verdadeiro montante do défice português de 2010. Se as dúvidas têm razão de ser, a redução do défice de 2011 e anos seguintes para os valores a que nos comprometemos será ainda mais difícil, acho eu.

Acabou!

Sócrates pediu a demissão. No estado em que deixa o país não sei se é para festejar. Mas a sensação é de alívio. Talvez os futuros governantes, sejam eles quem sejam, venham pedir mais sacrifícios. Mas que os peçam com justificação e sem mentiras. Já não será mau.

quarta-feira, 23 de março de 2011

Tradutore, traditore

A falta de cuidado de alguns tradutores que tratam as notícias transmitidas pelas nossas televisões pode prejudicar a compreensão das notícias. Muitas vezes resolvem aformosear as frases ditas pelos entrevistados ou de pessoas que participam em reportagens, substiuindo palavras ou expressões por outras, quando a tradução literal seria mais justa. Outras vezes não compreendem bem o que se diz e sai disparate. Principalmente quando a língua original é o alemão ou o francês, sai asneira pela certa.
Hoje houve duas situações semelhantes nas traduções, em legendas, das declarações de Jean-Claude Junker e do porta-voz da Comissão sobre as medidas do PEC português. Junker afirmou que as medidas preconizadas pelo governo português (PEC IV) tinham sido avalizadas pela Comissão. Pois na legenda apareceu que tinham sido analisadas. O sentido é totalmente diferente. Vi a reportagem 3 vezes e a palavra de Junker - avalisées - era bem audível e não deixava dúvida. Mais tarde, o porta-voz veio dizer que a aprovação das medidas era firme (ferme) e traduziram por estava fechada. Aqui o sentido é mais ou menos o mesmo, mas trata-se de um evidente erro de compreensão.

É preciso mais cuidado.

terça-feira, 22 de março de 2011

Até ver, é o governo que tem obrigação de governar.

Já vêm de há muito os apelos do governo aos partidos da oposição para que apresentem alternativas às medidas que eles criticam nos governantes. Se criticam, se dizem que não serve, têm de dizer como querem que se faça. Parece lógico, mas neste caso não é. Seria um apelo razoável entre iguais, entre colegas, amigos ou familiares: Não gostas do modo como eu faço, então diz tu como farias. Mas governo e oposição não são iguais. O governo dispõe de meios e tem acesso a informações que a oposição não tem.

No caso actual, Francisco Assis repete e repete o apelo: Se o PSD quer reprovar as medidas do PEC, deverá apresentar alternativas. Diz isto em várias ocasiões e em vários tons e critica o PSD por não fazer o que Assis pensa que teria obrigação de fazer. Mas não tem razão. Primeiro, porque o PSD não tem tanta informação sobre os dados económicos e financeiros do país como o governo. Segundo, porque o Ministério das Finanças dispõe de uma quantidade de funcionários que formam uma máquina poderosa para estudar alternativas e preparar as decisões, enquanto que Passos Coelho, por muitos economistas que tenha à disposição para o aconselhar, está longe de ter uma máquina semelhante. Por último, o PSD não é governo, e quem tem dever de governar é o governo; a oposição pode concordar ou discordar, mas se discordar é ao governo que cabe resolver a questão e, sendo minoritário, procurar alternativas que possam ser aprovadas pelo parlamento.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Ainda o PEC IV

Muito se tem dito e escrito sobre o PEC IV e as peripécias da sua apresentação ao PR, à AR, aos partidos, à Comissão Europeia, ao BCE e da sua divulgação ao povo. Quem soube primeiro as medidas a que o nosso Governo se comprometeu? Para além da discussão bizantina sobre o dia e a hora exacta em que ocorreu a divulgação e se foi primeiro em Bruxelas ou em Lisboa, em inglês ou em português, há uma questão que ainda não vi abordada por ninguém e que me parece ter alguma importância: A versão apresentada publicamente pelo ministro Teixeira dos Santos na manhã do dia 11 é muitíssimo mais resumida do que o documento enviado para Bruxelas datado do dia 10, mas que só terá seguido e sido recebida a 11, por ventura depois da apresentação. Basta comparar as duas versões e é fácil reparar nas diferenças. O Governo não teve a sensibilidade para saber que deveria divulgar a versão portuguesa da carta enviada a Bruxelas ou um documento equivalente, por ventura mais desenvolvido, mas nunca mais resumido, antes ou pelo menos simultaneamente ao seu envio para a Comissão e o BCE, já para não falar da apresentação oficial aos órgãos de soberania PR e AR, pelo menos.

domingo, 20 de março de 2011

Líbia II

Afinal, a minha memória não ajudou: A tal cimeira Europa-África II já se realizou, mesmo na Líbia, recentemente.


«Começou na Líbia a cimeira entre a União Europeia e África. O enviado-especial da RTP a Tripoli, António Esteves Martins, acompanhou o primeiro dia. O anfitrião Kadhafi abriu a sessão com um discurso crítico, insinuando a possibilidade de a África se voltar para outros parceiros, em consequência do fracasso europeu.
2010-11-29»

Mesmo assim, mantenho a sugestão de uma nova cimeira no mesmo local mas sem os 2 cavalheiros da figura.

Líbia

Quem se lembrará desta notícia do Público de 2007.12.09?

«A Líbia propôs organizar a próxima cimeira União Europeia-África, anunciou hoje em Lisboa o primeiro-ministro José Sócrates, no seu discurso de encerramento da II Cimeira UE-África.»




Eu não tenho tão boa memória que me lembrasse deste anúncio sem ajuda, mas por sorte caí em cima desta notícia ao fazer uma busca na net. Não sei porquê, mas desconfio que é melhor escolher outra localização para a próxima cimeira. E daí, talvez não, pode ser mesmo apropriado fazê-la numa Líbia renovada e sem Khadafi (e, já agora, de preferência também sem José Sócrates).

terça-feira, 15 de março de 2011

Apostas

Um amigo meu estava convencido que, na declaração que ia fazer ontem às 20 h, Sócrates informaria que o Governo, perante a recusa da oposição em dar o seu aval às medidas “corajosas” do chamado PEC4, se iria demitir ou pelo menos apresentar uma moção de confiança, com o que transformaria a crise política potencial numa verdadeira crise política. Disse-lhe que esse comportamento não me parecia o próprio do modo de Sócrates estar na política. Parecia-me antes que o PM iria dizer que o PEC4 era fundamental para a estabilidade e que a oposição, ao estar contra estas medidas, era culpada de desencadear uma crise que afogaria o País.

Infelizmente não chegámos a apostar nem umas cervejas nem sequer a feijões. Se tivéssemos apostado, eu teria ganho. Sócrates pensa que tem o monopólio da verdade e que é o salvador do País. Não admite que tem qualquer responsabilidade na crise económica que atravessamos nem nos resultados nulos das medidas que tem preconizado de 15 em 15 dias na tentativa vã fazer baixar as taxas de juro dos nossos créditos. A culpa é sempre da ganância dos especuladores, da sede de poder da oposição e em geral dos outros, nunca dele próprio e das suas políticas. Verdadeiramente, não há pior cego do que aquele que não quer ver.

domingo, 13 de março de 2011

O que os jovens precisam é de modernidade

Leio e custa-me a acreditar, mas indo às fontes primárias acabo por crer que Sócrates disse mesmo o que se diz que disse. É o que se pode chamar uma grande compreensão pelos problemas dos jovens de hoje. Era mesmo o que mais se reclamava na manifestação do "geração à rasca" era modernidade.

sábado, 12 de março de 2011

Sacrifícios: ultrapassado o limite?

Dois dias depois do discurso do PR em que lembrava que há limites para os sacrifícios que é possível pedir aos cidadãos comuns, eis que aparece de repente e sem aviso prévio um novo PEC imediatamente submetido a Bruxelas! Neste documento, apresentado no dia 11 de manhã pelo Ministro das Finanças numa sessão convocada na véspera à noite, anunciam-se novos sacrifícios, e não dos menores. Afinal a maravilhosa consolidação orçamental não estava a correr tão bem como o PM nos dizia ainda há poucas horas! O pacote não tinha sido discutido com os parceiros sociais nem tão pouco o PR tinha sido informado! Perante esta situação absolutamente aberrante, Passos Coelho foi claro: Apesar do entusiasmo com que as medidas foram recebidas na reunião dos ministros da eurozona, Passos Coelho declarou que o PSD não viabilizaria as medidas agora anunciadas.

quinta-feira, 10 de março de 2011

É a guerra!

Não, não me refiro à Líbia, onde, infelizmente, também há uma guerra mortífera entre um tirano e um povo que anseia por liberdade. A guerra a que me refiro agora é a declarada entre o Presidente da República recém reeleito e o partido do Governo. O discurso de tomada de posse do PR para o segundo mandato foi sentido pelo PS como um ataque. Um discurso inesperado, mas correctíssimo, rigoroso e certeiro. Todas as críticas que ouvi de diversos quadrantes pareceram-me descabidas. A mais importante, porque adiantada logo a seguir ao discurso pelo PM, foi a que apontava como uma falha a ausência de menção da crise internacional como causa da nossa crise, já que, segundo Sócrates, crise idêntica é sentida por toda a Europa. Esta declaração vem na sequência da constante dos discursos do PM que sempre que tem de falar nas dificuldades financeiras que atravessamos faz questão de afirmar que são consequência da crise internacional.

O certo é que as reacções de diversos elementos do PS mostraram o quão desagradados ficaram com as palavras, certamente duras mas justas, do PR. Estas reacções, mais do que o discurso, mostram que o clima de guerra está instalado. Aguardam-se os próximos capítulos.

PS: Muito certeiro o postal sobre o diagnóstico feito no discurso publicado no Quarta República.