quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Astrologia

Foi com espanto que ao folhear as páginas do jornal i do último dia do ano dei com o artigo «Fazer – Isto só lá vai com um mapa astral» da jornalista Ana Dias Ferreira, acompanhado por uma coluna de publicidade (acho que a informação dos nomes, telefones, preços e descrição da actividade não pode ser classificada de outro modo, mesmo que tenha sido gratuita) dos mais importantes astrólogos e tarólogos do país. Já há muito me conformei com encontrar páginas de horóscopos em revistas aparentemente sérias, mas que cedem às apetências dos seus leitores mais supersticiosos (ou crentes, para ser mais brando na classificação) para manter as vendas a níveis confortáveis. Mas ainda não me parece admissível ler num jornal de referência uma página completa com um artigo que toma a sério a astrologia e outras crendices, como o tarot, e não hesita em inserir no texto afirmações como: «Um trânsito de planetas e de astros [Os planetas também são astros, não são?], que em cruzamento com os signos e com os ascendentes pode explicar porque é que somos mais ou menos irascíveis, mais ou menos sortudos, mais ou menos capazes de dizer não» e «… é … um trânsito … determinante sobretudo na hora do nosso nascimento. Nascer com a Lua em determinado sítio ou com Plutão noutro pode contribuir para personalidades muito diferentes.» Pode? A jornalista acredita mesmo nisso? E quer fazer-nos acreditar?

Mais adiante a jornalista concede em avisar: «Segundo a astrologia – que uns defendem como ciência e outros como mera superstição –…». Se esta ressalva estivesse no início do artigo, antes das afirmações citadas, ainda vá, embora seja de duvidar que pessoas sérias defendam a astrologia como ciência. Ou estão de má fé ou não sabem o que é ciência e desconhecem o método científico como meio de explicação dos fenómenos naturais.

Um jornal sério não deveria incluir estes disparates e este apelo ao recurso à astrologia e crendices semelhantes nas suas páginas. Isto não vai lá com um mapa astral, isto só lá vai com bom senso e seriedade, o que manifestamente falta quando se promovem estas superstições e se incita descaradamente à consulta dos seus promotores.

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

O governo responde perante o parlamento ou é o inverso?

Até que enfim!! Muitas vezes, ao assistir a debates na Assembleia da República entre o governo e os deputados tenho ficado admirado quando o Primeiro-Ministro interpela os deputados da oposição fazendo-lhes perguntas em vez de responder às questões que estes lhe põem, sem que os interpelados lhe lembrem que o governo responde perante o parlamento e não o inverso.

Até que enfim, que um deputado, desta vez uma deputada, a líder do PSD, Manuela Ferreira Leite, lembra o PM que é ele que deve responder às perguntas dos eleitos pelo povo. Pois Sua Excelência não gostou e com ar revoltado disse à deputada que estava na AR para um debate e não para um interrogatório. Pois era, mas não devia esquecer que ao parlamento cabe o dever de fiscalizar os actos do governo e que deve portanto pôr questões, não devendo o PM escusar-se a responder. Já ser o PM a interrogar os deputados, é pelo menos aberrante.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Tempestade: uma imagem impressionante

A fotografia publicada no jornal i de 16 de Dezembro sobre a tempestade nos Açores é impressionante. Parece quase um quadro clássico. O contraste das águas lamacentas revoltas em primeiro plano com a casa velha e escura com as molduras das janelas muito brancas envolta em verdura parece um cenário. Não sei quem é o autor da fotografia, mas não resisti a reproduzi-la.

Quanto custam as energias alternativas?

Várias vezes tenho posto esta questão. Já procurei na net sem grandes resultados. Recentemente um artigo muito entusiasmado com as energias alternativas publicado no Scientific American de Novembro («A Plan for a Sustainable Future - How to get all energy from wind, water and solar power by 2030») apresenta algumas pistas para o que poderão vir a custar no futuro, mas não esclarece quanto custam agora. No entanto a questão é para nós especialmente importante, já que os governos de Sócrates apostaram no desenvolvimento destas fontes de energia e estamos a pagá-las, nós, os contribuintes e consumidores, à custa de subsídios e benefícios fiscais.

Li anteontem, no jornal i, que «cada um dos 5,3 milhões de clientes paga: * 36,3 euros por ano para a amortização do défice tarifário que inclui juros, * Cerca de 130 euros por ano para financiar o regime de produção especial que inclui eólicas, solar, mas também cogeração industrial».

Isto representa um total de cerca de 689 milhões de euros pagos pelos consumidores. Resta saber qual a fatia dos contribuintes. E não tenho escolha, não posso recusar-me a pagar, se quero continuar a ter electricidade em casa!

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

TGV

Concordo absolutamente. Assim, vamos a maior velocidade para a desgraça.

O empurrão para o abismo

TGV sai do papel como "resposta à crise", afirmou o Ministro das Obras Públicas, António Mendonça.
Pior do que responder ao fogo, deitando-lhe gasolina. E mais uma prova de que o abismo chama o abismo.
posted by Pinho Cardão @ 23:26

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Mitos sobre Salazar

Cada vez que leio qualquer coisa sobre Salazar e o período do Estado Novo, dou com exageros e mitos sobre o que se passava nesse anos. É o caso do ensaio sobre a tacanhez de Salazar, escrito por Marta Rebelo na separata «nós» do jornal i, intitulada «O homem que sabia muito bem o que queria e para onde ia não foi a muito lado». A referida crónica tem muitas coisas certas, outras discutíveis ou que reflectem a opinião da autora, mas que retratam relativamente bem a época. Há porém dois aspectos que me sinto obrigado a referir por não corresponderem à realidade, que conheço bem porque a vivi e observei como parte interessada.

O primeiro aspecto corresponde à repetição de mitos sobre a influência tentacular da ideologia do Estado Novo sobre os indivíduos e sobre as famílias:
Diz Marta Rebelo: «Nós por cá tínhamos a caneta azul da censura sempre pronta a cortar palavras excessivas ou críticas do regime.» Ora, como filho de um crítico que muito escreveu em jornais e tendo eu próprio colaborado num jornal de estudantes, conheci infelizmente de muito perto a acção da censura e posso rectificar que não se tratava de uma «caneta azul», mas sim de um lápis azul.
Neste caso a rectificação é mínima e quase ridícula. mas já não o é nas seguintes afirmações: «Tínhamos a Mocidade Portuguesa, meninos para um lado, meninas para outro, para crescermos dentro da ordem e conscientes dos valores vigentes: ‘Deus, Pátria e Família’» Ora marchei no pátio do liceu com a Mocidade Portuguesa, evidentemente separado das meninas, que até o liceu era só para rapazes, detestei a Mocidade Portuguesa, mas nunca ninguém me falou em Deus, na Pátria e em Família. Talvez os ímpetos iniciais da Mocidade Portuguesa como organização de doutrinação dos «valores vigentes» já se tivesse então perdido, mas na minha época as actividades limitavam-se a marchar e fazer algum desporto; nem a farda era obrigatória e muito poucos a usavam.
Outra frase: «E em cada casa, por cima do rádio ou depois da televisão adornada com o naperon, uma fotografia do Presidente do Concelho…» Nunca vi fotografias de Salazar em nenhuma casa particular; acho esta afirmação perfeitamente fantasiosa. É certo que não frequentava muito casas de adeptos do regime, mas em casas de famílias normais era coisa que não existia. Bem bastavam as fotos nas escolas e repartições públicas, que aí sim, a par do Presidente da República, a fotografia de Salazar era obrigatória.
Finalmente, afirmar que «tínhamos a polícia secreta, a PIDE, que afastava ajuntamentos de mais de três…» é um manifesto exagero. Não tinha a PIDE mais que fazer!

O segundo aspecto corresponde a uma falsidade científica: «António de Oliveira Salazar … conseguiu … codificar a nossa genética como povo.» «Nos dias de hoje … inauguraram uma praça com o seu nome… Não há maior prova de contaminação do nosso ADN pela tacanhez do presidente do Conselho.» Ora no tempo de Salazar não eram conhecidas técnicas de manipulação genética e os caracteres adquiridos (admitindo que Salazar transmitiu a sua tacanhez às gerações que viveram o Estado Novo) não se impregnam no ADN nem codificam a genética dos indivíduos.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Não resisto a transcrever; em poucas palavras está (no 31 da Armada) o retrato do país, um retrato que não é bonito de se ver.

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Sexta-feira, 11 de Dezembro de 2009

A realidade do País em 2009 é de que há mais de 560 mil desempregados, 20% de Portugueses pobres, um défice público superior a 8% do PIB, uma dívida externa que cresce mais de 30 milhões de euros/dia, uma crise económica e social generalizada, falta de competitividade das empresas, corrupção instalada, desprestígio nas instituições políticas, uma queda acentuada da natalidade (que se prevê já abaixo dos 100 mil nascimentos em 2009), e por aí fora.

Perante isto, as grandes prioridades políticas do PS são a regionalização e o casamento gay.
Porreiro, pá.
Estamos no bom caminho.
É preciso é fingir que não se passa nada, adiar os sacrifícios e esperar que isto não rebente nas mãos da rapaziada que se governa com o País.
O último que feche a porta.»

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Kafka não inventaria melhor

Fiquei verdadeiramente espantado com o relato feito por Mário Crespo da descrição do interrogatório a que foi sujeito António José Saraiva. Além do inusitado da convocatória para um Centro de Reinserção Social, chocaram-me e preocuparam-me as questões postas ao inquirido sobre o que pensava do segredo de justiça e de outros aspectos, além de outros pormenores cada qual mais inesperado e chocante. Já se fazem em Portugal interrogatórios sobre opiniões!

Só me veio à memória Kafka e um romance inédito escrito pelo meu filho aos 18 anos que começa com um interrogatório a um honesto consultor fiscal em circunstâncias estranhas. Mas esta realidade ultrapassa a ficção. Espero reacções.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

É fazer a conta

Ficou célebre a atrapalhação de Guterres ao querer calcular de cabeça o défice em percentagem do PIB, não só por não saber bem o valor deste como por não ter sido capaz de fazer a conta.

Mas muito mais grave é a afirmação de Sócrates, sem qualquer atrapalhação, confrontado com o valor da taxa de desemprego em Outubro revelada pelo Eurostat de 10,2%: "O desemprego subiu uma décima."
Uma décima?! Uma décima de quê, uma vez que em Setembro o valor divulgado foi de 9,2%? Se pretendia dizer que subiu uma décima do valor anterior, isto é, uma décima de 9,2, até estaria certo, mas não é assim que se exprimem variações de taxas. A subida foi de 1 ponto percentual. De qualquer modo, a subida é muito grave e qualquer tentativa de disfarçar a gravidade chamando-lhe uma décima ou uma centésima é deitar poeira para os olhos. Os novos trabalhadores despedidos deveriam dar-lhe a resposta. E a crise deixou de servir de desculpa, visto que desta vez ultrapassámos a média da zona euro e da UE.